Chorei três horas, depois dormi dois
dias.Parece incrível ainda estar vivo quando já não se acredita em mais
nada. Olhar, quando já não se acredita no que se vê. E não sentir dor
nem medo porque atingiram seu limite. E não ter nada além deste amplo
vazio que poderei preencher como quiser ou deixá-lo assim, sozinho em si
mesmo, completo, total.Ontem chorei. Por tudo que fomos. Por tudo o
que não conseguimos ser. Por tudo que se perdeu. Por termos nos perdido.
Pelo que queríamos que fosse e não foi. Pela renúncia. Por valores não
dados. Por erros cometidos. Acertos não comemorados. Palavras
dissipadas.Versos brancos. Chorei pela guerra cotidiana. Pelas
tentativas de sobrevivência. Pelos apelos de paz não atendidos. Pelo
amor derramado.
Pelo amor ofendido e
aprisionado. Pelo amor perdido. Pelo respeito empoeirado em cima da
estante. Pelo carinho esquecido junto das cartas envelhecidas no guarda-
roupa. Pelos sonhos desafinados, estremecidos e adiados. Pela culpa.
Toda a culpa. Minha. Sua. Nossa culpa. Por tudo que foi e voou. E não
volta mais, pois que hoje é já outro dia. Chorei...
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